Você já se fez esta pergunta: O que é uma “boa morte”?

“A morte deveria ser assim: um céu que pouco a pouco anoitecesse
e a gente nem soubesse que era o fim…” (Mario Quintana)

Na sociedade moderna há uma tendência, principalmente entre alguns médicos, de assimilar a morte de um paciente como um fracasso. O avanço tecnológico da medicina e seus infindáveis recursos para prolongar a vida – às vezes, desnecessariamente – são potencializadores desse pensar médico. Então, busca-se por meio desses recursos prorrogar a vida ignorando o fato de que o apito final já soara.

Neste sentido, há uma pergunta que precisamos nos fazer, e com certa urgência. Afinal, o que constitui uma “boa morte”? O que queremos quando trazemos para discussão algo tão subjetivo quanto esta desconcertante pergunta? Queremos provocar uma reflexão sobre uma das maiores questões da vida: a arte de morrer bem.

As pessoas não são encorajadas a falar sobre sua própria morte. Sempre acham que isso só acontecerá num futuro distante e que não vale a pena abordar esse assunto quando se está gozando de plena saúde. Contudo, a vida não é permeada de certezas absolutas. A vida é permeada por inconstâncias, incertezas e, às vezes, por uma assustadora imprevisibilidade. Por isso, seria interessante as pessoas incluírem em seus planos de vida a morte.

Felizmente para a sociedade, alguns médicos, profissionais da saúde, professores, sacerdotes e até poetas estão se dedicando a discutir sobre o que seria uma “boa morte”, promovendo uma importantíssima reflexão sobre o tema. Contudo, o morrer é subjetivo e exclusivo. A forma como morremos está intrinsicamente moldada pela combinação de atitudes, condições físicas, tratamentos médicos desejados, relações interpessoais e, claro, pelo sentido que damos à vida. Segundo o Dr. Haider Warraich (2017), uma boa morte pode e deveria significar algo diferente para cada indivíduo. Ele é autor do livro “Modern Death – How Medicine Changed the End of Life”. Ele diz – “Para mim, significa alcançar um fim que alguém poderia querer, e isso realmente pode significar qualquer coisa – de estar numa unidade de terapia intensiva, ter acesso a todos os tipos de terapias sustentadoras da vida, estar em casa cercado pela família ou estar sendo cuidado num hospice” (Repa, 2017).

Ao ler diversos artigos sobre o tema me parece que há um consenso sobre o que seria morrer bem. Para a maioria uma “boa morte” se dá num ambiente tranquilo e confortável, sem dor física, sem pendências psicoemocionais, sem estresse e de bom humor, espiritualmente assistido e, claro cercado por seus entes queridos. Agora, como podemos obter tudo isso? Uma das maneiras é manifestar seus desejos e discuti-los com sua família e amigos.

Infelizmente, a nossa sociedade não gosta de falar de morte e, por isso, as pessoas morrem mal e desassistidas em seus desejos. Ter um planejamento claro e objetivo sobre suas vontades ao morrer pode ser reconfortante.

Pensando em todas as questões que envolvem uma “boa morte” e, me preparando para um futuro trabalho, eu convidei alguns amigos de diferentes seguimentos da sociedade a me contar o que era para eles uma “boa morte”. As respostas estão a seguir.

Pergunta: Na sua opinião o que é uma “boa morte”, ou seja, o que é morrer bem?

Amigos convidados:

André Jacobucci (Engenheiro / Consultor de TI)
É uma morte serena, lúcida, tranquila e natural. Que deixa atrás de si paz, gratidão, saudade, aprendizado, amor, esperança. Uma boa morte é um renascimento para o Pleno e Eterno.

Daniela Traldi (Jornalista e Historiadora)
A meu ver, a boa morte é como a boa vida…é quando vivemos conscientes de que o corpo que habitamos é finito. Não estou sugerindo que devamos pensar sobre a morte em tempo integral, mas quando temos essa consciência, esse entendimento – o de que cada um de nós, sem exceção, irá um dia morrer – a vida em si passa a girar de maneira diferente. Muito mais plena, eu diria. Vejo nesse processo da boa vida, e, portanto, da boa morte, como o encontro à felicidade, ao abraço de momentos únicos, ao calor do coração e a toda e qualquer aventura do dia-a-dia. Pode ser algo bem simples, como apreciar um pedaço de bolo maravilhoso, a leitura de um livro espetacular ou observar uma cena qualquer no meio da rua. Nesse sentido, apesar dos muitos planos, eu realmente tento viver como se não houvesse amanhã, pois dele nada sei, e muito menos se aqui estarei. Quando a morte chegar da forma que for, espero, terei vibrado com o sol, com a chuva, com a dor, com o amor, sozinha – e com aquilo e aqueles que me fizeram sorrir ou chorar.

Gláucia Pina (Psicóloga)
Morrer bem é morrer quando a morte chega ou quando o viver acaba. Só para completar: coloquei o ou porque para mim são movimentos diferentes.

Gláucia Silva (Advogada)
Uma boa morte, na minha opinião, é sair de cena tendo ao nosso lado, ao menos, uma pessoa querida. É não estar ligado a aparelhos e a um ambiente impessoal de UTI. É poder refletir instantes antes e saber que o que se deixou de fazer durante a nossa vida poderia mesmo ficar sem ser feito… ficar para trás.

Helena Oliveira (Enfermeira)
No meu entender e minha experiência profissional uma morte boa é quando o paciente aceita a morte, se prepara para ela, é indolor. Os familiares respeitam e aceitam a morte como uma viagem. A aceitação traz a paz. A sensação de já ter vivido tudo que tinha que ser vivido, sem revolta. E ter a vontade respeitada. Estar rodeado da família e/ou amigos ou estar só. É muito pessoal.

Izabel Christina (Astróloga)
A morte é um treino diário de desapego, em todos os níveis. Morrer bem é desapegar e se soltar para uma viagem, uma grande e definitiva mudança.

Keco Brandão (Músico)
Morrer bem, é morrer como um sopro de vida que, simplesmente, se esvai. Como a chama de uma vela que simplesmente se apaga!

Insta287

Marcelo Perez (Médico)
Acho difícil ter uma boa morte ou morrer bem, nunca aceitamos a morte como bem ou boa, mas o que se espera é morrer sem sofrer, sem dor, sem coisas para acertar ou fazer (sem nós na vida) a melhor forma talvez seria dormindo.

Mônica Paz (Taróloga)
Para mim uma boa morte é algo sem sofrimento, hospitais e montes de aparelhos.
Recentemente uma tia morreu assim, deitou e morreu durante a noite. Estava saudável e lúcida. Na época comentei que ela tinha morrido bem e se eu pudesse escolher, gostaria que comigo também fosse assim.

Patrícia Brentzel (Sommelière)
Na minha opinião uma boa morte é aquela com qualidade de vida e sem sofrimento.

Peta Campangna (Professora de Matemática)
Para mim, morrer bem é ter uma morte serena, sem dor e sem arrependimentos.

Rômulo Braga (Veterinário)
Estar confortável, tranquilo e junto dos que ama com o mínimo de sofrimento físico e emocional possível.

Rosângela Rocha (Jornalista e Secretária)
Uma boa morte é estar com o espírito tranquilo. Em paz com Deus, com você e com o próximo. Sentir o corpo leve.

As respostas acima demonstram que, de fato, cada pessoa possui uma forma individual e própria de compreender o morrer, de acordo com suas crenças, convicções e expectativas. E isso não poderia ser diferente. Pois, a morte é óbvia e inevitável, mas o morrer é um ato individual e subjetivo.

E para você? Já parou para pensar o que seria uma “boa morte”?

Design sem nome

Psic. Mestre em Cuidados Paliativos
Psic. Especialista em Perdas e Luto
Especialista em Psicologia Hospitalar
Psychotherapist Member of British Psychological Society (MBPsS/GBC)
Blog Perdas e Luto

Autora do Livro: Legado Digital: Conhecimento, Decisão e Significado – Viver, Morrer e Enlutar na Era Digital

Referências:

Repa, Barbara Kate. What Is a “Good Death”? Site [Caring.com] Mai. 2017. Disponível em: https://www.caring.com/articles/a-good-death

The Arte of Dying Well [Site]. What is dying well? Disponível em: http://www.artofdyingwell.org/

7 comentários sobre “Você já se fez esta pergunta: O que é uma “boa morte”?

  1. Gostei muito deste seu post querida Nazaré!
    “Uma Boa Morte” para mim é saber que fez o melhor que poderia fazer na vida, saber que vai morrer; para ter tempo de estar com as pessoas que ama, se despedir com aceitação, se entregando, com desapego e confiando! É difícil!
    Se estiver doente terminal, pedir para ter uma morte com dignidade se preparando,com cuidados, com assistência médica, psicológica, espiritual e social!
    Acho que falar da morte é natural por que ela faz parte da vida!
    Obrigada!

    Curtido por 1 pessoa

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Imagem do Twitter

Você está comentando utilizando sua conta Twitter. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s