Luto Complexo Persistente: quando o tempo de compreensão da perda se prolonga

“O tempo não cura tudo. Aliás, o tempo não cura nada, o tempo apenas tira o incurável do centro das atenções” (Martha Medeiros)

No meu último post eu discuti a questão do tempo num processo de luto. Ainda sobre essa questão podemos tecer várias reflexões que passam por dois vieses: o técnico e o da vivência prática de pessoas enlutadas. O técnico está descrito no DSM. Para quem não conhece, o DSM é o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, criado há algumas décadas para unificar a terminologia sobre as doenças mentais pela APA, Associação Psiquiátrica Americana que está na sua 5º edição.

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Filmes: Possibilidades de Reflexão sobre a Morte e o Luto

Antonius – Nenhum homem pode viver com a morte e saber que tudo é nada
Morte – A maioria das pessoas não pensam nem na morte ou no nada”
(Filme O Sétimo Selo – Ingmar Bergman)

Eu sou uma cinéfila confessa. Considero a sétima arte absolutamente sublime. Como professora, considero filmes uma ótima ferramenta de auxílio para a compreensão de diversos conceitos. Os filmes não só nos divertem, mas são capazes de nos fazer refletir, favorecendo assim novas formas de lidar com questões e conflitos do nosso cotidiano. Compartilho, então, algumas sugestões de filmes que nos convidam a uma reflexão sobre a temática da morte e do luto.

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Manchester à Beira-Mar: um mergulho na dolorosa experiência humana do luto e da culpa

“Luto complicado; é complicado” (Colin M. Parkes)

No último dia 06 de outubro eu participei do Complicated Grief Study Day, um dia inteiramente dedicado ao estudo e a reflexões sobre luto complicado promovido pela Child Bereavement, uma entidade inglesa que presta assistência às pessoas enlutadas. Dentre as palestrantes estava a Dra. Katherine Shear da Universidade Columbia – NY, uma autoridade no assunto. Fora um dia interessante. Contudo, fez-me refletir sobre a linha tênue que distingue um processo de luto natural e complicado. Esta distinção não é das tarefas mais fáceis de fazermos.

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Luto não elaborado: as repercussões psicoemocionais na vida adulta

“O entardecer traz consigo a noite, a escuridão, as sombras, o desconhecido, que também dão sentido à vida, fazendo parte dela. No dia seguinte, no horizonte da vida, surgirá mais um dia de viver, mesmo que não estejamos presentes. Será sempre outro dia de viver e talvez seja o último e derradeiro. No amanhecer, encontra-se outro entardecer. O entardecer é a metáfora da morte. Dia e noite são partes do mesmo e único fenômeno, vida e morte” (Maria Emília Bottini)

A morte de um dos pais é um dos eventos mais difíceis que uma criança pode enfrentar. Ela expõe prematuramente à criança a imprevisibilidade da vida e a natureza tênue da existência cotidiana. Estudos com adultos que apresentavam alguns distúrbios psíquicos e/ou mentais, especialmente depressão, revelam frequentemente lutos mal elaborados vivenciados na infância, sugerindo que tal perda pode contribuir para o agravamento de transtornos psiquiátricos e que esta experiência pode tornar uma pessoa emocionalmente vulnerável para a vida.

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Tipos de Luto: Sim, existe mais de um

“Na solidão da escuridão, quase consegui sentir a finitude da vida e sua preciosidade. Não damos valor, mas ela é frágil, precária, incerta, capaz de terminar a qualquer momento, sem aviso”. (Livro: Marley e Eu)

O Luto é um processo que se inicia após o rompimento de um vínculo e estende-se até o período de sua elaboração – quando o indivíduo enlutado volta-se, novamente, ao mundo externo. O luto é um processo essencial para que nós possamos nos reconstruir, nos reorganizar, diante do rompimento de um vínculo. É um desafio emocional, psíquico e cognitivo com o qual todos nós temos que lidar.  Inclui transformação e ressignificação da relação com o que foi perdido.

Contudo, você sabia que há uma classificação e tipos diferentes de luto? Pois bem, eu fiz uma pesquisa e montei de uma forma didática o que se refere cada tipo. Minha intenção é apenas que esta lista seja uma ferramenta de referência para que você possa entender os diferentes termos que utilizamos para explicarmos o processo de luto que determinado indivíduo e/ou uma comunidade está vivenciando.

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Filmes: Recurso pedagógico para refletirmos sobre a temática da morte e do luto

“Você tem que saber responder a essa pergunta: se você morresse agora, como você se sentiria a respeito da sua vida? ” (Filme Clube da Luta)

Filme as Horas Eu sou uma cinéfila confessa. Considero a sétima arte absolutamente sublime. O cinema fez parte da minha formação: meu trabalho de conclusão de curso em psicologia foi uma análise psicossocial do fenômeno suicídio no filme “As Horas“, no qual eu analisei o suicídio de Virginia Woolf. Como professora, considero filmes uma ótima ferramenta de auxílio para a compreensão de diversos conceitos. Os filmes não só nos divertem, mas são capazes de nos fazer refletir, favorecendo assim, novas formas de lidar com questões e conflitos do nosso cotidiano. Compartilho, então, algumas sugestões de filmes que nos convidam a uma reflexão sobre a temática da morte e do luto.

Morte: Morrer é tão somente terminar de viver

Filme: “A Partida” (Departures – Yojiro Takita)

filme-a-partida Daigo Kobayashi é um jovem trabalhador músico violoncelista, casado e desempregado, que retorna a sua cidade natal após a sua orquestra ter sido dissolvida. Ele consegue emprego numa pequena empresa de lavagem de defuntos que presta serviço para empresas funerárias. O novo emprego de Daigo irá lhe propiciar novas percepções sobre si e sobre sua vida. Interessante é que, no filme, é por meio desse trabalho que Daigo começa uma reflexão de cunho existencial sobre o sentido da morte e, consequentemente da vida. Para mim, um dos filmes mais belos que melhor ilustra os estigmas em torno do assunto.

Luto: Um processo que se inicia após o rompimento de um vínculo e estende-se até o período de sua elaboração – quando o indivíduo enlutado se volta, novamente, ao mundo externo. O luto é um processo essencial para que nós possamos nos reconstruir, nos reorganizar, diante do rompimento de um vínculo. É um desafio emocional, psíquico e cognitivo com o qual todos nós temos que lidar. Leia o post sobre luto  em https://perdaseluto.com/2015/03/27/o-processo-de-luto/

Filme: “P.S. Eu te amo” (P.S. I Love You – Richard LaGravenese)

PS Eu te amo Holly Kennedy é casada com Gerry, um engraçado irlandês por quem é completamente apaixonada. Quando Gerry morre, a vida de Holly desmorona. Em profunda depressão, ela descobre com surpresa que o marido deixou diversas cartas que buscam guiá-la no caminho da elaboração do luto. Gosto desse filme, pois ele aborda um tema tão desconcertante – viuvez precoce – de uma forma equilibrada e leve.

Luto Complicado: Existem situações em que o processo de luto, principalmente por morte de um ente querido, não segue a evolução normal, ou seja, o indivíduo não consegue se reestruturar, podendo ocorrer fixação numa das etapas e, consequentemente, a não elaboração do luto. Num processo de luto complicado há uma dificuldade extrema em aceitar a perda. Leia o post sobre luto complicado em https://perdaseluto.com/2015/04/15/o-luto-complicado/

Filme: “Reine sobre mim” (Reign over me – Mike Binder)

Reine sobre mim No terrível atentado terrorista de 11 de setembro de 2001, Charlie Fineman perdeu tudo que lhe era mais caro: esposa, filhas, cachorro. Desde então Charlie largou sua carreira de dentista, se tornou um recluso, paranoico, depressivo e compulsivo por reforma. Charlie se nega a entrar em contato com as lembranças do seu passado e as emoções que as permeiam. Até que um dia Charlie reencontra seu colega de quarto dos tempos da faculdade Alan e sua vida começa a mudar de rumo. Esse filme é excelente para explorar o conceito dos 5 estágios do luto pelos quais boa parte das pessoas passa ao lidar com a morte.

Luto Antecipatório: Este pode ser entendido como um processo de luto que ocorre antes da perda real. Este processo é vivenciado pelo paciente e pela família, na fase compreendida entre o diagnóstico e a morte propriamente dita.

Filme: “Minha Mãe” (Mia Madre – Nanni Moretti)

mia-madre Este filme explora a morte lenta da mãe de uma cineasta, ela sabe que sua mãe não tem muito tempo de vida. Porém, de início ela resiste a acreditar, mas ela sabe que a mãe está morrendo. Mia Madre é na verdade um filme de despedida, ou do quão difícil e angustiante uma despedida pode ser, por mais que seja há tempos aguardada.

Filme: “Para sempre Alice” (Still Alice – Wash Westmoreland e Richard Glatzer)

Still_Alice_-_Movie_Poster Este filme conta a história Alice Howland, uma linguista de sucesso, diagnosticada com Alzheimer aos 50 anos – o que é raro para a idade. O filme, por meio, da evolução do quadro clínico de Alice nos convida a refletir sobre a fragilidade humana diante dos contratempos da vida. Alice precisa se preparar para perder tudo aquilo que conquistou, ver sua vida e a de seus filhos passando rápido e lidar com o fato de que em pouco tempo ela não saberá mais quem ela é.

Luto na Terceira Idade: As perdas no último estágio da existência humana.

Filme: “Hanami – Cerejeira em Flor” (Kirschblüten Hanami – Doris Dörrie)
hanami Este filme é absurdamente belo. Trudi descobre que seu marido Rudi está com uma doença terminal e, seguindo a sugestão do médico, decide fazer uma grande viagem de férias com ele. Porém, como a vida é absolutamente imprevisível Trudi morre subitamente, quando estão visitando o litoral, e Rudi decide ir ao Japão para lhe prestar uma última homenagem. Lá é a época do Festival das Cerejeiras em Flor. Este filme aborda com sensibilidade a morte de uma pessoa que é considerada fundamental e traz como pano de fundo a viuvez na terceira idade. Ele nos faz refletir sobre a brevidade da vida, assim como das flores de uma cerejeira.

Filme: “Elsa & Fred” (Marcos Carnevale)

Elsa e Fred O filme aborda diversos aspectos vivenciados na velhice e, entre os temas, está a dificuldade em superar o luto por viuvez. Fred é um pacato senhor de 78 anos que se muda para um novo prédio, logo após ficar viúvo, e conhece Elsa sua vizinha que tem quase 80 anos. Ela, que sofre de grave doença, é muito otimista e comunicativa, e tenta viver intensamente cada dia, enquanto Fred é um hipocondríaco e quieto. Mesmo com essas diferenças, e pela insistência de Elsa, essas diferenças são superadas e juntos redescobrem o prazer de viver, a cumplicidade e a amizade.
No filme, é revelada a possibilidade do encontro com a vida, principalmente no campo dos afetos.

Luto pela morte de um filho: A morte de um filho, para muitos, é algo avassalador. É indizível e imensurável. Mas, após a elaboração do luto, e as memórias gravadas na alma, é possível reencontrar o equilíbrio emocional e reorganizar a vida. Dando assim, um outro sentido ao viver.

Filme: “O Quarto do Filho” (La stanza del figlio – Nanni Moretti)

quarto_do_filho O filme aborda a devastadora experiência da perda de um filho. Giovanni é, um psicanalista que reside e trabalha na pequena cidade de Ancona, na Itália. Ele é casado com Paola e tem dois filhos: a menina Irene e o jovem Andrea. Sua vida transcorre tranquila, dividida entre a família e o consultório, até que uma tragédia a transforma completamente. Numa manhã de domingo, Giovanni recebe uma ligação urgente de um paciente, e deixa de ir correr com seu filho, como havia prometido. Andrea, então, vai mergulhar com os amigos. E não voltará. Gosto desse filme por dois motivos: aborda com profundidade como a morte de um filho pode abalar a estrutura familiar e também, como nós terapeutas lidamos com nossas angustias diante de um evento traumático, muito interessante.

Apenas a título de menção: Outros filmes absolutamente interessantes!

Luto: A Delicadeza do Amor e Uma Nova Chance para Amar.

Luto Antecipatório: Minha vida sem mim, Doce Novembro, A culpa é das Estrelas e Outono em Nova York.

Luto na Terceira Idade: Up: Altas Aventuras e Amour

Luto pela Morte de um Filho: Reencontrando a Felicidade e Uma prova de Amor

Como pudemos observar há vários filmes interessantes que podem nos entreter, mas também, nos faz refletir sobre a morte, o morrer e o luto. Boa reflexão!

Design sem nome

Psic. Mestre em Cuidados Paliativos
Psic. Especialista em Perdas e Luto
Especialista em Psicologia Hospitalar
Psychotherapist Member of British Psychological Society (MBPsS/GBC)
Blog Perdas e Luto

Autora do Livro: Legado Digital: Conhecimento, Decisão e Significado – Viver, Morrer e Enlutar na Era Digital

O Luto Complicado

“São só dois lados da mesma viagem. O trem que chega é o mesmo trem da partida” (Milton Nascimento)

Existem situações em que o processo de luto, principalmente por morte de um ente querido, não segue a evolução normal, ou seja, o indivíduo não consegue se reestruturar, podendo ocorrer fixação numa das etapas e, consequentemente, a não elaboração do luto. Num processo de luto complicado há uma dificuldade extrema em compreender a perda. Nestas circunstâncias, o luto permanece não resolvido ao longo do tempo, durante vários anos, e, por vezes, para o resto da vida, interferindo no estado emocional da pessoa e impactando significativamente a sua vida. Este se caracteriza por uma melancolia duradoura, acompanhada em geral de profunda tristeza, problemas de saúde, distúrbios psíquicos e diminuição dos contatos sociais.

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