Laços Familiares: Ressignificando a morte de um irmão

“Ter um irmão é ter, para sempre, uma infância lembrada com segurança em outro coração” (Tati Bernardi)

Eu costumo dizer que este blog é um presente para a minha alma pois todos os dias eu sou agraciada com histórias que me fazem refletir sobre a importância do amor e dos vínculos afetivos que construímos ao longo de nossa existência. Muitas das histórias me fazem crer que devemos amar o outro intensamente, sem medo e sem restrição, para que o sentido da vida se faça valer.

A história que compartilho com vocês a seguir, com a devida autorização, é da Carolinne Kandelman, que perdeu o irmão há dois anos. Na maioria das vezes o luto pela perda de um irmão é ofuscado ante a dor dos pais. As pessoas voltam seu olhar e cuidado para os pais, pois enterrar um filho é, de fato, uma tarefa dificílima. No entanto, ao perdermos um irmão estamos rompendo com um dos laços mais significativos de nossas vidas. Não existe uma palavra para descrever a perda de um irmão. Se você perde seus pais, você é órfão. Mas, se você perde um irmão não há um adjetivo que caracterize essa perda. Por isso, a importância de reconhecermos e cuidarmos da dor emocional desse irmão/irmã.

“Para Rodrigo”
Texto escrito por: Carolinne Kandelman

“A única certeza da vida é a morte. Ainda assim, toda vez que essa certeza bate na nossa porta nós nunca estamos preparados para recebê-la.
Quando a morte bateu na minha porta ela chegou sem fazer nenhum sentido, me pegou desprevenida e meu mundo desabou. A dor e o vazio tomaram conta. O mundo que eu pensei conhecer deixou de existir.

Meu irmão, meu melhor amigo faleceu há dois anos atrás e isso me destruiu. Aquele que dormia no quarto ao lado, dividia comigo seus sonhos, sua vida, suas conquistas. Aquele que me dava os melhores conselhos e me conhecia melhor do que ninguém de repente não estava mais ali fisicamente. Meu irmão partiu para o outro plano e junto com ele se foi parte do meu passado, do meu presente do meu futuro.

Em muitos momentos tive o desejo de escrever sobre tudo isso, mas a verdade é que eu não queria receber afeto de ninguém. As opiniões, os conselhos não eram bem recebidos. Eu não estava pronta para eles. Eu precisava ficar sozinha, em silêncio com a minha dor. Às vezes, isso ainda acontece. Eu estava enlouquecida, com muita raiva, completamente perdida, entorpecida, solitária e extremamente preocupada com os meus pais. Me sentia também muito culpada por não ter sido eu que viesse a partir, pela minha impotência de não conseguir fazer nada para salvá-lo.

Post_Irmão

Com o tempo comecei a buscar compreender que, de alguma forma, tudo aquilo poderia ter algum significado. Aos poucos comecei a me abrir e falar sobre tudo isso e percebi a grande importância de falar sobre o Rodrigo, de deixá-lo vivo sempre, todos os dias. Comecei a compreender que, apesar de fisicamente ele não estar mais aqui, ele continua vivo e presente na minha vida, hoje e todos os dias. Que sempre ele vai estar do meu lado.

O luto é algo para ser vivido, mas não existe fórmula de como vivenciá-lo. Ele é único e intransferível. Cada pessoa precisa de um tempo e um formato para lidar com ele. Cada um vive seu luto da melhor forma que é possível. Ele não é um processo lógico, é repleto de altos e baixos. Por isso, temos que respeitar o enfrentamento de cada um. O importante é saber que vivenciar o luto é fundamental no processo de cura. No meu processo de cura aprendi que o perdão é fundamental. Que o AMOR é o que rege a vida, é o que alimenta a alma. Que é preciso pedir e aceitar ajuda daqueles que confiamos e amamos, não precisamos ser fortes o tempo inteiro. Que respeitar seu próprio tempo e os seus sentimentos é legitimo e uma demonstração de amor a você mesmo.

Rodrigo, meu irmão amado. Obrigada por estar sempre por perto. Obrigada por sempre que possível estar nos mandando sinais e mostrando que aqui é só uma passagem, que a vida é muito mais grandiosa do que esse plano. Obrigada pela amizade e pelo amor puro e infinito. Gratidão por ter você na minha vida, por você me escolher para ser sua irmã nessa sua curta jornada. Somos um só. Te amo!”

(Rodrigo morreu em 2016 aos 22 anos devido a complicações relacionadas ao tratamento de leucemia)

Pudemos ver pelo relato da Carolinne Kandelman o quão importante é expressarmos os sentimentos advindos num processo de luto e vivenciá-los. Ao final da leitura lembrei-me de uma das frases mais clássicas de Colin Parkes (1998) sobre o verdadeiro significado de um processo de luto. “A dor do luto é tanto parte da vida quanto a alegria de viver; é, talvez, o preço que pagamos pelo amor, o preço do compromisso”.

Psic. Mestre em Cuidados Paliativos (M.Sc.)
Psic. Especialista em Perdas e Luto
Especialista em Psicologia Hospitalar
Psychotherapist Member of British Psychological Society (GMBPsS)
Blog Perdas e Luto (Instagram)

Livro à VendaAutora do Livro: Legado Digital: Conhecimento, Decisão e Significado – Viver, Morrer e Enlutar na Era Digital

Referências:
Parkes, Colin Murray. Luto: estudos sobre a perda na vida adulta. Trad.: Maria Helena Franco Bromberg. São Paulo: Summus; 1998. 291 p.

32 comentários sobre “Laços Familiares: Ressignificando a morte de um irmão

  1. Oi Nazaré, estive hoje 16/05 em Cajuru na sua palestra, hoje faz um mês e dois dias que perdi minha irmã. Minha vida ainda está em cacos, nós passamos de três a cinco horas no celular todos os dias, ela era minha mãe, minha melhor amiga e minha irmã. Está doendo tanto que não sei se algum dia vai passar ela era a alegria da nossa casa. Tinha 50 anos morreu de parada cardíaca. A nossa alegria morreu.

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    • Olá Daiani! Sinto muito por sua perda, meus sentimentos. A sua perda é muito recente e você ainda vivenciará muitos sentimentos em relação a esta perda. Contudo, o mais importante é expressar esses sentimentos e ter paciência para consigo mesma. Abs, Nazaré Jacobucci

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  2. Dia 18 de agosto vai completar três anos que perdi o meu irmão tinha 38 anos. Ele era a pessoa mais alegre que já conheci. Solteiro, Jovem, Bonito, Muito inteligente, falava vários idiomas, desenhava divinamente. Gostava de animar as festas como DJ. De repente fiquei sem ele. Era o vão central da ponte. Não tenho mais pai, mãe. Eu tinha ele. A minha casa hoje é muito triste. Eu e os meus três filhos sentimos muito a falta dele. E não tem nada que consiga preencher esse vazio que ficou. E assim vamos vivendo.

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  3. Puxa! Me encontrei nessa história da Caroline kandelman! Também perdi meu irmão em 2016, meu irmão mais velho, que também foi minha mãe e meu pai, pois foi com quem vivi após a morte de minha mãe, quando eu tinha 13 anos. Nunca consegui lidar com o luto e, devido a perda dele, acometido por um câncer, vivenciei uma depressão. Já perdi muitos familiares para o câncer: mãe, tia, avó, irmão, e isso me aterroriza cotidianamente. Acredito que nesse espaço, lendo esses textos, a forma como falam das perdas, eu posso encontrar ajuda para encarar os meus medos e vivenciar as perdas de uma forma diferente. Obrigada.

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  4. Perdi meu irmão, também chamado Rodrigo, há pouco mais de 07 meses, é muito dolorido sim, e o blog tem me dado muita força. No texto da Caroline ela consegue muito bem mostrar o que ela, e eu também sinto, muita falta do meu Rodrigo, mas tentando ter forças para enfrentar essa jornada aqui, na certeza de um dia nos reencontrarmos e dar aquele abraço, e aí, vai estar tudo bem novamente 😦

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  5. Boa noite, percebi que não existem muitos textos, principalmente academicos como artigos, sobre o processo de luto em relação a perda de irmãos… Gostaria de saber, se você tem algum conselho, e também, indicação de livros que fale sobre isso, ajudará muito na minhas pesquisa.
    Att.

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    • Olá Luise! Infelizmente, não temos mesmo muitas publicações a respeito do tema. Peço a gentileza que escreva para duas Instituições que talvez tenham algo para lhe indicar. As Instituições são: 4 Estações Instituto de Psicologia e Entrelaços Instituto de Psicologia. Abs, Nazaré Jacobucci

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  6. Também perdi meu irmão só q vai fazer 9 anos!!
    No primeiro ano fugi o máximo que pude, no segundo ano fui assaltada e quase morri, me recuperando dessa outra pancada da vida, passei no vestibular e me tranquei por 5 anos e meio num curso pesado e estressante…
    Agora que estou vivendo o luto e acredite que tá sendo triste, mas necessário, muito importante viver esse luto e superar ele…
    Meu irmão morreu em 10 de outubro de 2011 também em decorrência do tratamento de leucemia!
    Gratidão pelas palavras da amiga!!
    💖💙

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    • Olá Leidy! Sinto muito pela sua perda, meus sentimentos. Seu relato é muito importante no sentido que, ele remete a importância de se vivenciar um processo de luto. A dor é imensa, mas este processo se faz necessário para que possamos viver com a dor integrada à nossa vida e a saudade se torne memória. Abs, Nazaré Jacobucci

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  7. Bom dia,
    Perdi minha irmã de 25 anos para Covid 19, dia 01/08/2021, ela era saudável só antecipou a primeira dose da vacina por que, às vezes, a pressão subia, mas o médico falou que ela era saudável e nem remédio pra pressão usou durante a internação, tinha um filho de 4 anos, eu era muito amiga dela, ela era como filha, porque sempre cuidei dela desde que ela nasceu, eu tenho 40 anos, eu pedi para minha mãe engravidar, eu dei nome e estive com ela todos estes anos até as suas últimas mensagens é muito difícil continuar.

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  8. Boa noite a todos! Meu nome é Ricardo Fernandes perdi faz 1 mês meu irmão Rodrigo Fernandes, ele tinha 30 anos de idade veio falecer por COVID e Pneumonia ficou entubado 35 dias na UTI, estou depressivo e não consigo aceitar a morte dele 😭

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    • Olá Ricardo! Sinto muito por sua perda, meus sentimentos. Primeiramente sua perda é muito recente, você ainda está na etapa da assimilação da perda. Portanto, tenha muita paciência para com seus sentimentos e os expresse sempre que possível. Outra questão é que nós não aceitamos a morte, nós compreendemos a ausência e isso leva um certo tempo. Esse tempo é diferente de pessoa para pessoa e nós não podemos precisar quanto tempo levará seu processo de luto. Abs, Nazaré Jacobucci

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  9. Perdi meu irmão há 11 meses. Foi a pior coisa da vida! Foi para um câncer, que chegou e já o levou, muito rápido! Fiquei sem acreditar, sem aceitar (não mudei muita coisa não). Ele é meu irmão mais próximo, meu irmão mais velho. Tenho 6 irmãos, mas não somos unidos. Esse meu irmão Bruno foi quem cuidou da gente após a morte de nossos pais. Ele era bruto, grosso, mas amigo e eu me sentia protegida! Ele brincava muito comigo, a gente se entendia muito! Foi ele que esteve comigo pra tudo! E agora a vida o levou, isso pra mim foi de uma crueldade sem igual! Me sinto solta no mundo, sem base, sem família. Eu o amo muito e amarei pra sempre! Hoje to tentando me reequilibrar, sou casada e tenho um filho, ele foi a minha força pra passar por isso, confesso que se não tivesse meu filho já teria desistido de viver. Mas continuo, meu irmão se foi e levou parte de mim.

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  10. Eu também perdi meu irmão, ele morreu aos 27 anos devido uma doença chamada polimiosite que afetou o seu pulmão e causa insuficiência respiratória. Eu também venho passando por dificuldades para esquecer ele. Gostei muito de ver essa história foi muito bom para mim!

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  11. Que linda está carta ao irmão, chorei e me emocionei porque já quase dois meses perdi meu único Irmão de 45 anos, com metástase hepática. Novo cheio de sonhos, na minha memória ele jamais morrerá do ser humano bondoso que era com todos. Gratidão irmão Fernando por ter sido a sua irmã nesta vida, saudades!

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  12. Perdi minha irmã em setembro de 2021, por complicações de um câncer de colo de útero, o qual ela tratou por dois anos. Ela ficou por quase 90 dias internada em tratamento paliativo em Barretos e eu e minha mãe ficamos junto com ela. Ela faleceu na minha frente. É algo inexplicável e uma dor que dilacera o coração todos os dias. Ela era minha melhor amiga, brigávamos como a maioria dos irmãos, mas não conseguíamos ficar longe uma da outra, principalmente eu dela, porque ela me protegia, estava ali sempre pronta p me ouvir e me ajudar, me defendia do mundo. Hoje me sinto incompleta, vazia, sem sentido na vida… Ainda é difícil entender e por mais que as pessoas tentem nos consolar com palavras, não resolve porque o que queremos na verdade é a pessoa de volta e isso sabemos que fisicamente, não teremos. Eu a sinto comigo o tempo todo, mas mesmo assim sinto falta da presença física dela e isso me destrói muito todos os dias. Tenho dois filhos, um de 23 e um de 9 anos e o menor era extremamente grudado nela e ele falou na escola quando perguntaram qual era o sonho dele, ele respondeu : Que minha tia volte a vida!

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    • Olá, Luciana! Sinto muito por sua perda, meus sentimentos. A sua perda é muito recente, por isso tenha paciência para com seus sentimentos e não deixe de expressá-los, isso é muito importante num processo de luto. Assim como, deixe seu filho expressar o que está sentindo. É importante a criança ter seus sentimentos validados pelos adultos. Abs, Nazaré Jacobucci

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